Eu sei que o hospital anda diferente. Eu vejo tudo diferente pelas janelinhas do computador. As paredes estão diferentes. A cor do hospital. A luz do sol que nos abraça na antessala entre os dois corredores do terceiro andar. As pessoas estão diferentes.
Eu também estou diferente. Mudei o cabelo. Deixei de lado o chapéu que cobria a cabeça e dei lugar a um cabelo que parece macarrão antes de entrar na panela. Fiquei uma mistura de abacaxi com árvore de natal, disseram.
As mudanças são muitas. É só olhar ao seu redor. Tudo –absolutamente tudo– mudou. Eu, daqui, consigo ver as mudanças daí, no hospital.
Só não consigo ver ainda os sorrisos das pessoas que encontro. Vejo de uma ou outra criança, mas não vejo no sorriso das pessoas adultas, da maioria delas. Mas isso não é porque as pessoas deixaram de sorrir. Isso ainda não mudou.
Ainda mantemos a capacidade de sorrir, mesmo em meio a tantos horrores. A alegria é sentimento que transforma tudo que toca. E espero que isso nunca mude.
Eu não vejo a boca sorrindo porque há uma proteção indispensável para enfrentarmos a pandemia, mas vejo sorrisos nos olhos. Os mesmos olhos que choram de tristeza também aprenderam a sorrir –e até a chorar– de alegria.
Quando a gente encontra alegria, a gente sorri com o corpo todo. Eu vejo. Pela janelinha do computador consigo ver os olhos de quem ainda ousa cultivar alegria em tempos tristes. Que revolução! Vocês me inspiram!
Penso que depois que tudo isso passar, nenhum de nós será igual ao que era antes.
Talvez demore um pouco até a gente conseguir se abraçar novamente. Talvez demore um pouco mais pra gente conseguir ver de novo a boca sorrindo, mas tenho certeza de que nunca mais desaprenderemos de sorrir com os olhos.
Espero que muito em breve a gente deixe de se comunicar apenas pela janela do computador e passe a se encontrar com as janelas das nossas almas.