Conversávamos com J. em sua enfermaria. Em dado momento, bati o olho naquele aparelhinho que controla a medicação dos pacientes. Era manhã e, nessa máquina, uma informação me chamou a atenção: TEMPO: 04:20:47.
– O seu relógio está atrasado por quê, J.?, perguntei.
– Não sei, Svenza…, respondeu com um sorriso.
Olhei de novo. TEMPO: 04:20:42 e 41, 40, 39, 38, 37…
– Como pode isso? Olha que estranho… Teu relógio foi mal programado, o tempo tá voltando!
– Svenza, é uma máquina do tempo!, ajudou a Dra. Baju.
– Verdade, Baju!
– Nossa! A gente pode voltar pra refazer um bocado de coisa que a gente gostava de fazer e também pra corrigir as porqueiras…
Um silêncio de cumplicidade se estabeleceu.
– Se pudesse voltar no tempo, pra onde você gostaria de voltar?, perguntei a ele.
– Pra casa.
De novo, o silêncio, mas diferente. Sabe quando “desce seco”? Foi assim que engolimos. Não tínhamos sequer um carro de duas rodas, que fosse, pra levar J. de volta pra casa. Tampouco tínhamos autoridade pra isso, até porque a nossa especialidade é a Besteirologia.
Enquanto ele não recebe alta, nós ficamos por ali, passando o tempo juntos – por mais que este pareça não querer passar. Aliás, o tempo é um troço suspeitoso, controverso, estranho mesmo, não acham? Costumamos entender que o tempo é um só pra todos nós, mas às vezes o tempo passa num tempo pra mim e noutro tempo pra você.
Há quem diga que o tempo nem existe, que ele é uma criação das nossas cabeças. Talvez por não existir, ele nunca passe. Talvez o tempo seja apenas o que é: o presente. São muitas as reflexões e especulações sobre o tempo, mas seja o que for, passa. Tudo passa.