Depois de 20 anos atuando no Doutores da Alegria resolvi parar, olhar para trás e fazer uma retrospectiva artística. Senta que lá vem história!
(na foto: Raul Figueiredo e seu filho João Gabriel)
VINDO DO INTERIOR
Venho de uma família religiosa que trabalhou por muitos anos como voluntária em uma associação que atendia cerca de 150 mulheres em condições de vulnerabilidade social na minha cidade natal, Catanduva, interior do Estado de São Paulo.
Toda semana, minha mãe ensinava às moças como se deve cuidar de uma casa, dava noções de higiene, dicas sobre alimentação, aulas de bordado e crochê. Meu pai também ajudava, em um domingo por mês, conversando com os maridos das mulheres e regularizando sua situação. Muitos deles eram desempregados, ex-presidiários, sem carteira de trabalho, título de eleitor ou certificado de reservista.
Aos sábados percorríamos as ruas do bairro recolhendo jornais pela vizinhança, que depois eram estocados na garagem da minha casa para serem vendidos aos comerciantes e feirantes. Esse dinheiro era usado para a manutenção do trabalho voluntário da instituição e para minha mãe comprar tecidos e costurar pijaminhas para as crianças, filhos dos casais assistidos por eles.
Vivi essa realidade dos 10 aos 16 anos e sempre que estava de férias ou em casa sem tarefas da escola, ia com a minha mãe à associação e ficava tocando violão para as crianças na creche. Também fui tocar violão em asilos com meus pais e isso foi inspirador para mim. Sempre pensei em fazer o mesmo quando crescesse!
POR QUE RESOLVI SER PALHAÇO
Depois de passar pela música (piano e violão), pelo canto e pelas Artes Cênicas (ator), vi no palhaço a possibilidade de abraçar todas as Artes, pois o palhaço é tragicômico, melodramático, nonsense, lúdico e exige muita habilidade física e mental. Exercitar-se como palhaço é reconhecer-se a cada dia, ampliando os horizontes da imaginação, deixando o impossível cada vez mais possível.
Pergunto-me: será que dava para ser outra coisa?
CHEGANDO A SÃO PAULO
Em 1992 terminei o curso de Artes Cênicas na UNICAMP e vim morar em São Paulo. Comecei a atuar em algumas companhias paulistanas de teatro e conheci o trabalho dos Doutores da Alegria em 1995 por meio da atriz Alexandra Golik, que atuava comigo e já fazia parte do elenco.
Nesse mesmo ano fiz teste e fui selecionado para entrar na ONG.
NO DOUTORES DA ALEGRIA
Atuei por 11 anos como o besteirologista Dr. Zappata Lambada em todos os hospitais que o programa atende e atendeu em São Paulo, e também em outras unidades da ONG.
Estive nas montagens de espetáculos infantis (“Vamos brincar de médico” e “Senhor Dodói”), ambos premiados e com excelentes críticas e aceitação do público, e atuei como músico substituto no infantil “Poemas esparadrápicos”, produzido pelo elenco da unidade de Recife.
Também estive em outras apresentações como o saudoso “Midnight Clowns”. Em empresas, participei de muitas palestras institucionais, inúmeros RISOs 9000 e outras ações.
Durante esse período de atuação comecei a dar algumas oficinas de música e jogos para o elenco de palhaços, em nossos treinamentos às sextas-feiras. Essa experiência rendeu um convite para integrar a equipe de formação da organização. Desde 2007 dou aula na Escola dos Doutores da Alegria, mas lá em 1999 eu já ajudava na construção de conteúdo.
Atualmente sou professor de música no segundo ano do Programa de Formação de Palhaço para Jovens e auxilio na criação da trilha sonora do exercício cênico.
Foi em 2007 que também criamos o programa Palhaços em Rede, do qual sou tutor desde o seu início. Nessa função tive o prazer de viajar pelos quatro cantos do país dando oficinas de orientação e formação para grupos de palhaços com diferentes formas de atuação que visitam hospitais.
Trocamos ricas experiências em nome de um movimento: a arte estimulando a mudança, promovendo a qualidade das relações humanas e cultivando a saúde.
Quase 21 anos… Doutores da Alegria é uma parte de mim. E já que vim parar aqui, daqui não saio, daqui ninguém me tira!