Quando a gente dá de cara com a alegria, não dá pra resistir. Sobe ao peito uma sensação de preenchimento. Às vezes falta o chão.
A alegria, quando vem forte, toma conta do nosso corpo e faz perder a noção do tempo. Leva embora o vazio. Depois, enquanto nos deixa para que outros afetos se apoderem, sai em forma de sorriso, de paz, de vida. Cada um vai descobrindo, ao longo da sua trajetória, onde encontrar fontes de alegria: um abraço de mãe, a garfada na comida preferida, a visão do mar, um beijo, a conquista de um diploma, a lambida do cachorro.
Quando adoecemos, enxergamos na cura da enfermidade a saída para que voltemos a desbravar o mundo e esbarrar em momentos de alegria. Parece que o corpo saudável é condição para isso. Se a doença nos faz permanecer no hospital por mais tempo, tentamos criar explicações que façam sentido – pelo menos pra nós mesmos – do porquê deste martírio.
Afetos tristes e olhares piedosos podem se instalar. A consciência domina qualquer tentativa de escape, de imaginação. Colocamos a nossa reabilitação à mercê do destino.
Mas… Calma. Não é preciso estar saudável pra sentir alegria. A gente sabe. Requer, talvez, algum esforço para espantar esses afetos tristes e abrir espaço para os encontros. Sim, mais um esforço além de todos aqueles pedidos ao paciente – pelos profissionais de saúde, por nossos parentes e pelo próprio corpo, debilitado e atrás de energia para se recuperar.
Já contamos muitas histórias de pacientes que conseguiram tirar poesia do cotidiano no hospital. Gente que desviou o foco do medo da agulha ou da decepção com a recuperação lenta. Isso não significa que o medo não surgirá segundos antes da injeção, mas traz a descoberta de que a dor é apenas uma parte da experiência no hospital… E, por que não, uma parte da vida?
Quando a alegria se instala em um corpo em que a saúde encontra resistência, ela potencializa afetos positivos, traz intensidade, faz nossos motores voltarem a funcionar. Restaura, afinal, a ânsia de vida. Depois ela nos abandona, como deve ser, para lembrar de que é preciso ter força para encontrá-la novamente.
No hospital ou fora dele, talvez não seja preciso forçar a barra para encontrar sentido e utilidade naquilo que passamos, ancorando-se em forças sobrenaturais ou ficando à deriva de um destino, mas estar disponível para que os afetos como a alegria nos atinjam e restaurem algo que as crianças sabem bem e que aprendemos com o primeiro respirar, dolorido, dos nossos pulmões recém-nascidos: que a força e a potência de vida estão em nós mesmos.