Dizem que saudade é uma palavra exclusiva das línguas portuguesa e brasileira. Substantivo abstrato. Tão abstrato que a gente nem sabe definir exatamente o que é. “Sentir falta” é insuficiente para definir a grandeza que cabe numa saudade.
Fui pesquisar no Google a origem da saudade. Lá diz que herdamos dos árabes (“saudad”); diz também que vem do latim (“solitate”). Em todo caso, saudade significaria “isolamento, solidão”.
Vai ver é por isso que ultimamente estou vivendo de saudades. O isolamento social involuntário, os dois meses distante de quem amo, os 101 dias que não vejo o mar, as mais de 2.142 horas longe do hospital… Tudo isso faz com que eu sinta solidão, um tipo específico e abstrato de solidão: a saudade.
Dia desses eu fechei os olhos e imaginei as brincadeiras no hospital! Imaginei-me cantando e dançando pelos corredores, conversando e abraçando as crianças, e os adultos – também crianças. Imaginei-me mostrando pra todo mundo a música nova que estou aprendendo a cantar.
É só no hospital que eu consigo realizar esse meu sonho de ser um cantor. Sonhos… Sonhos… Sonhos… E saudade.
Às vezes, paro na janela de casa e fico olhando o tempo. Eu tento entender como que alguém conseguiu prendê-lo num relógio, num calendário, numa agenda. O tempo parece contínuo e incessante, mas também rápido e fugaz, impossível pegá-lo com as mãos. E tão abstrato quanto a saudade é o tempo. Saudade é amiga íntima do tempo.
Há de chegar o tempo em que voltaremos a cantar pelo hospital e, quando esse tempo chegar, não sentirei mais saudades! Nesse dia sentirei apenas o presente! Pensando bem, enquanto espero, escolho também sentir esse presente.
Só no presente é possível estar vivo e fazer a diferença. Com quem posso falar hoje? De que formas posso me expressar? Por quais brechas posso manifestar o amor e fazê-lo presente na vida das pessoas amadas?
O que está ao meu alcance é o meu hoje. Que a saudade e o sonho sejam dínamos do presente para o futuro.