Uma ideia vem matutando em minha cabeça nesta quarentena e quero dividir com vocês, caros leitores.
Como parte da equipe de Comunicação da Doutores da Alegria, sigo cumprindo o isolamento social, atenta ao que profissionais e especialistas em saúde vem alertando. E este período inédito e esquisito que vivemos inseriu muitas palavras em nossas conversas cotidianas. Pandemia. Coronavírus (com sua brasileiríssima variação “coronga vírus”). Isolamento social. Quarentena. Respirador. Colapso. Achatamento da curva. E uma velha conhecida: crise.
São muitas as crises: crise na saúde, crise econômica, crise financeira, crise moral, crise política, crise emocional, crise mundial. É a crise que me pegou nesta quarentena, é a crise que povoa as minhas ideias. Interessada na versatilidade da palavra, fui atrás de sua origem no dicionário.
Vamos às origens
Lá vai: crise deriva do grego κρίσις, que significa “decisão, determinação, julgamento“. Por ter a mesma origem da palavra crivo, que “separa o duto de água em jatos menores”, podemos pensar crise como “separação, passagem estreita, afastamento”.
Essa primeira definição me lembrou de onde escrevo neste momento: a minha casa. Sigo, assim como muitos que podem, neste dia em que o número de mortos pela Covid-19 ultrapassou 7 mil pessoas no Brasil, separada. Sigo afastada. Para além da economia, a crise neste isolamento se manifesta aqui em casa através da saudade dos familiares e amigos que se acumula, da ansiedade por não saber como será a vida na próxima semana, do medo de ter mãe e irmão atuando em hospitais, da montanha-russa de emoções que segue acelerada a cada nova notícia.
Com o dicionário em mãos, assimilo outros significados de crise: em medicina, “trata-se de o momento que define a evolução de uma doença para a cura ou para a morte”. Confesso que achei essa definição um pouco tudo ou nada, sem nuances. Quer dizer que em uma crise de saúde só é possível melhorar ou piorar de vez? Os pacientes que arrastam doenças por anos, com sucessivas crises, estão fadados somente à cura ou à morte?
Acredito que não. Ou talvez estivemos usando a palavra equivocadamente, dando um peso maior do que ela carrega. Afinal, estamos em uma crise de saúde pública sem precedentes neste momento. Mas antes, com gestão ineficiente, hospitais públicos abarrotados, falta de profissionais de saúde em regiões mais remotas, pagamentos de servidores em atraso e insustentabilidade dos planos de saúde… Era o quê?
Bem, vamos ao terceiro significado de crise. Calma que eu tô chegando lá. Em economia, “fase de transição entre um surto de prosperidade e outro de depressão, ou vice-versa”. A crise econômica é bem assimilada por nós, brasileiros, ainda que de formas extremamente desiguais. O crescimento do país, que vinha dando saltos de galinha, agora deve andar para trás, acompanhando a tendência mundial. Pergunto então: antes da pandemia estávamos em um período de prosperidade ou depressão?
Agora prometo que é a última: no teatro, a crise é o momento em que as forças em conflito atingem seu grau máximo de tensão, levando ao desfecho ou à resolução. Hmm. Essa me pareceu a definição mais agradável. Fechei os olhos e lembrei dos artistas palhaços em momentos decisivos no palco! Tá aí uma crise da qual eu sinto saudades! Em tempo: a foto que ilustra o texto é de Andre Stefano no espetáculo “Numvaiduê”.
Do dicionário ao… Google, claro!
Depois desse passeio tortuoso pelo dicionário, cometi outra penitência: quantas vezes as pessoas de todo o planeta buscaram pela palavra “crise” no Google nos últimos 5 anos?
Deu pra ver que o interesse pela palavra explodiu em março de 2020, né? Mas calma: fui checar períodos anteriores (o máximo permitido pelo Google Trends é 2004) e a busca foi três vezes maior em 2008, durante a crise financeira mundial. Eu me pergunto o que o gráfico mostraria se existisse Google em 1918, no surto da gripe espanhola.
Onde começa e onde termina?
Bem, eu não tenho conseguido diagnosticar onde a crise começa e onde ela termina. Quando é que – pra usar um termo da moda – achatamos a curva das crises? Das emocionais e das econômicas? Das morais e das de saúde?
Na ausência de respostas rápidas, fui buscar ajuda poética: procurei por Fernando Pessoa no Google. Acrescentei sorrateiramente a palavra crise. Resultados: “Pessoa forjava uma crise de identidade”; “Pessoa morreu de crise hepática”. Eita, a crise também pegou nosso poeta!
Pensamento compartilhado, caro leitor ou leitora, é agora que peço sua ajuda. Uma palavra ou emoji que seja, dê uma força com estas questões que invadem a minha quarentena. Mas… Se não tiver a mínima ideia, tá tudo bem, sem crise!