Fomos pegos de surpresa. Já estávamos prestes a sair da enfermaria quando ele chegou à porta escoltado por sua mãe, que arrastava o porta soro. Ele estancou do lado de fora e nós estancamos do lado de dentro.
Uma coisa que nós, besteirologistas, aprendemos rápido é quando os nossos pacientes estão ou não receptivos à nossa presença.
Pelo arregalar de olhos e parada brusca, freando o impulso de entrar, detectamos um caso clássico de rejeição à primeira vista e ficamos parados no meio da enfermaria aguardando os próximos passos para sair daquela situação – ou ficar nela.
A mãe de Robério insistiu empurrando-o para que entrasse. Ele, feito um burrico empacado, desses que por mais que empurre ou puxe não saem do canto, se recusava a entrar.
Mas, mães, às vezes, parecem um trator querendo derrubar a barreira claramente definida pela criança. Mas num gesto forte de quem diz “AQUI EU NÃO ENTRO”, Robério bateu o pé.
Imediatamente demos um pulo para trás “de medo” daquela pisada tão forte. Ele parou de resistir à pressão para entrar e ficou observando os dois bobos se empurrando:
-“Vai tu!”
-“Eu mesmo não, vá você!”
-“Ficou louco? Você viu o que ele fez?”
-“Tá, então eu vou!”.
Dei um passo à frente e o Robério bateu forte com o pé, saí correndo pra me esconder. Ele olhou pra mãe com ar de riso, ciente de que tudo indicava que ele era mais forte que aqueles dois.
Mandei o Dr. Wago tentar a saída. Mal deu dois passos e o menino bateu forte com os dois pés. Na carreira pra se esconder, o besta esbarrou em mim e meu cabelo voou pelos ares. O riso tomou conta da enfermaria com todos se perguntando como aquela história iria terminar.
Sim, porque diante desse “drama” uma pequena audiência se formou também do lado de fora. Nós não podíamos sair e o Robério, que não queria entrar, agora não queria sair da porta. Era um tal de bater o pé e corre-corre dentro da enfermaria. Até que num vacilo do garoto, transportamos o limiar da porta.
Ele se assustou, mas se lembrou do seu superpoder batendo forte o pé e nos fazendo sumir de vez. Quero dizer, sumir naquele dia, pois nos encontramos outras vezes no hospital. Ele corria pra junto da mãe quando nos via, mas batia o pé e a gente corria.
Certa vez ele estava distraído, sentado num carrinho, quando percebeu a nossa presença. A sua mãe não estava por perto e ele se levantou depressa, bateu o pé e nos colocou a correr. Desta vez veio atrás da gente e, sempre numa distância segura, batia o pé se divertindo da forma como “fugíamos” dele.
O fato é que nosso jogo estava estabelecido. Não precisava ter medo de nós, pois ele tinha a força necessária para nos manter à distância. Até que se deu conta de que não era exatamente isso que queria, demonstrando de forma inequívoca quando nos viu certa manhã.
Estampou o sorriso no rosto, abriu os braços e veio correndo. Foi um abraço caloroso selando assim uma nova fase em nossas vidas.
Dr. Eu_zébio (Fábio Caio), Dr. Gonda (Tiago Gondim), Dra. Muskyta (Olga Ferrario), Dr. Wago Ninguém (Wagner Montenegro) e Dra. Baju (Juliana de Almeida)