Durante o tempo em que realizei a seleção de novos artistas para o elenco dos Doutores da Alegria, colecionei uma série de momentos únicos: aqueles em que cada palhaço mostrava porque ele ou ela passariam a fazer parte do elenco.
Não foi diferente com Juliana Gontijo, nossa Dra. Dona Juca Pinduca.
Juliana era uma ótima bonequeira. Fazia fantoches e marionetes e lhes dava vida própria para auxiliar na conexão entre a criança e o besteirologista. O hospital era o Albert Einstein; o ano, 1997. Dia do teste de Juliana.
Visitamos uma menina de 12 anos de idade. Ela nos deixou entrar, mas não parecia estar no seu melhor dia. Educada, respondia a nossas perguntas bobas, sorria de volta. Foi quando Juliana, ou melhor, Doutora Dona Juca Pinduca teve a inspiração de apresentar sua linda criação: uma boneca bailarina que precisava se alongar para começar a dançar.
A manipulação da bailarina era tão suave que a menina começou a acompanhar com os olhos. Sentou-se mais ereta e sorriu ainda mais quando a bailarina deu um “jeté” e pousou, “en pointe” na beira da cama.
– Ela dança bem! Eu sei porque estudo ballet!
Juliana e eu nos olhamos, surpresos. A cumplicidade foi imediata entre a menina, a besteirologista e a bailarina! Minha missão foi ser plateia para aquele momento, além de constatar que Juliana era a mais nova integrante do elenco dos Doutores da Alegria!
Juliana era uma mulher renascentista: atriz, palhaça, música, bonequeira, figurinista, costureira e, mais que tudo, entusiasmada. Na acepção da palavra: quando os deuses habitam seu espírito.
Um momento inesquecível foi no Midnight Clowns, espetáculo no extinto Teatro Crowne Plaza. Ao final de uma rendição da música da barata (“A barata diz que tem sete saias de filó; é mentira da barata, ela tem é uma só!”), Juliana tomava o palco no papel de… Barata!
Figurino e caracterização, criados por ela, inclusive as oito pernas da barata que, quando apareciam, eu não aguentava de tanta vontade de rir… A plateia vinha abaixo! Para completar, Claudio Carneiro, Dr. Boeing, entrava em cena carregando uma sandália gigante, ameaçando a barata de ser espatifada…
Momento inesquecível de puro deleite!
Sem contar o quanto minha mãe era fã de sua dupla com a Vera Abbud, quando vocês cantavam a música da Lua. Vocês foram cantar para ela quando hospitalizada e, depois, em sua missa de sétimo dia. Não esquecerei jamais desse gesto.
Obrigado, Juliana, por sua inquietação artística constante, por não hesitar um minuto na missão de dar vida às loucuras criativas e maravilhosas que nossas cabecinhas insanas produziam. E que alegraram tantas plateias e hospitais.
Cada vez que contarmos a história de como você e Val de Carvalho conseguiram mobilizar o Hospital do Mandaqui e o elenco dos Doutores para que Mateus visse a lua pela primeira vez, você estará lá, presente. É a tal da ressurreição, me explicou uma vez um espiritualista.
Isso é você: um clássico, uma lenda, uma parábola, uma verdadeira artista, uma estrela. Com toda reverência, te aplaudimos de pé! Sempre!