Ele toca logo cedo. O palhaço acorda, olha, vê a hora, aperta função “soneca” e dorme mais um pouco, se alongando. Ele toca novamente. Não tem jeito: o palhaço levanta, toma banho, café, se prepara e sai. Não esquece nunca de levá-lo no bolso.
No ponto de ônibus, ninguém se olha, estão todos conectados. Só tiram os olhos dele pra ver se é o ônibus certo. Entram no coletivo, passam o Bilhete Único, não olham pra cara do cobrador que está ali – muitas vezes também conectado no seu mundo. O palhaço observa: ninguém se olha, ninguém conversa.
fonte: YouPIx
O palhaço desce do ônibus e pega o trem lotado de gente; e cada pessoa está com um aparelho, ligado, ouvindo música, jogando, rede social ou qualquer outra opção que o aparelho e o plano fornecem, é só baixar. É e tanto aparelho… Ai Pad, Ai Fone, Tablete, G3… Ai Pim. Ai, conversa comigo, ai, me escuta, ai, que doideira!
E assim o trem segue. Hebraica-Rebouças, Cidade Jardim, Vila Olímpia, Berrini, Morumbi, Granja Violeta, Santo Amaro, Socorro, Jurubatuba, Autódromo, Primavera-Interlagos. Durante todo o trajeto, um rio – sujo – que mesmo assim tem muita beleza pra se ver. Capivaras, quero-quero, garças e uma infinidade de animais e aves que ninguém vê. O palhaço observa.
Chega ao Grajaú. Palhaço desce, sobe a ladeira, se prepara e vai trabalhar. No corredor e nos quartos, muitas crianças e mães, todos com seus aparelhos. Quando não estão no mundo virtual, filmam, fotografam seus filhos com os palhaços. Vamos nessas fotos para o Brasil inteiro.
Dia desses, uma criança deitada com seu aparelho nem olhou para os palhaços que estavam na porta do quarto, perguntando se podiam entrar. Silêncio. A criança não olhou.
E o palhaço não perdeu tempo e com a boca soltou um poderoso e barulhento PUM. Todos olharam para a porta, inclusive o menino, e riram muito. Os palhaços, que nem sempre são bobos, aproveitaram a oportunidade, entraram no quarto e fizeram seu trabalho.
Esse foi um dia em que um PUM venceu o mundo virtual, mesmo que por alguns minutos. SALVE OS PUNS.
Dr. Valdisney (Val Pires)
Hospital do Grajaú – São Paulo