Chegamos ao final da temporada de estreia do Numvaiduê, o espetáculo de comemoração dos 25 anos de Doutores da Alegria.
Ficamos em cartaz em setembro e outubro no Teatro Eva Herz, em São Paulo, com 11 palhaços em cena. Foram dois meses de apresentação com, felizmente, casa lotada. Além disso, passamos por dois meses de intensa criação e ensaios. E, antes disso, muito tempo para conseguirmos apoios e projetos para que o espetáculo saísse do papel para as nossas cabeças.
Confesso a vocês que algumas vezes tive receio da estreia.
O processo de criação requer tempo e muitas coisas criadas são descartadas no produto final, um trabalho de abandono do ego de cada um dos palhaços, um eterno pensar no bem de um todo, e não só no individual. Aliás, fiquei muito feliz com o produto que resultou desse trabalho. Reflete e muito, na minha opinião, o que fazemos no hospital.
Em nosso trabalho pontual, deixamos a graça de lado, algumas vezes, para vivermos momentos graciosos, onde o que interessa não é o riso por si só, mas um riso que possui qualidade na relação com o outro. No teatro, apresentamos para 200 pessoas e, no hospital, muitas vezes apenas para paciente e mãe.
– A arte ajudando a entender a vida, em Bora.ai/Estadão
– Doutores voltam ao palco com elenco impecável, em Revista Crescer
– Numvaiduê, em Revista Veja
– Doutores da Alegria é indicação de críticos infantis, em Folha
Como transportar esse encontro do leito para o palco?
Essa era a minha apreensão e acredito que de todos que participaram do processo. Como representar 25 anos de trabalho de todos os palhaços que já passaram pela instituição Doutores da Alegria? Como transportar para o palco as nuances das mudanças de 25 anos de trabalho? A delicadeza, o poético e o gracioso juntos, sem cair no piegas…?
Acredito que conseguimos. No palco, saímos um pouco da graça do picadeiro, sem desvalorizá-la, e habitamos a graça hospitalar. Sensível, sem pressa, cuidadosa, com olhar apurado e música.
O hospital está lá: em cada seringa, garrote, máscara, luva, enfermaria, berçário, sala de espera… Por sinal, como retratar uma sala de espera de hospital de uma forma leve, poética e teatral? Eu e Dr. Zequim nos trocamos todas as segundas e quartas em uma salinha colada à “triagem”, onde costumamos falar que se tivéssemos um botão de invisibilidade para passar por lá seria sensacional.
Sabemos que as pessoas que lá estão talvez não queiram nem ver uma dupla de seres estranhos. Dor e apreensão imperam no ar. E respeitamos isso, sem nunca desrespeitar quem tem interesse naquela dupla que por lá passa. Isso requer uma escuta e um olhar apurado e treinado para isso e, principalmente, calma.
Mas não só calma. Todos os dias visitamos as alas que passaremos antes de nos caracterizarmos. Isso nos permite saber se a “triagem” está cheia, vazia, confusa, violenta… E acredito que em Numvaiduê, a presença da “sala de espera” e/ou “triagem” é fundamental. E lá está ela, em duas cenas!
E não tem como deixar de agradecer a todos do Hospital M’boi Mirim que foram nos ver no teatro: médicos, enfermeiros, pessoas da Administração e muitos outros setores. Aos que não puderam ir, não se sintam tristes, pois foram muito bem representados.
E bem, há de haver uma nova temporada ano que vem!