Vou contar duas rapidinhas que aconteceram comigo no Itaci, o Instituto de Tratamento do Câncer Infantil, neste mês. Uma prova de que o Portunhol deveria ser a segunda língua oficial do Brasil.
Hablas español?
A Bia mexia no celular quando entramos em seu quarto. Estava estudando espanhol. Resolvemos sair do quarto, entrar de novo e só falar em espanhol.
Dr. Dus’Cuais: Hola, buenos dias!
Bia: Buenos dias!
Dr. Trillo: Boi nos dias!
Dus’Cuais: No, Trillo, no es “boi nos dias”, es “buenos dias”!
Trillo: Yo no consigo hablar buenos dias, solamente boi nos dias.
Dus’Cuais: Entonces diga buenas noches!
Trillo: Mas Dus’Cuais, agora não é noite…
Bia seguia acompanhando tudo. O celular tinha ficado de lado.
Dus’Cuais: Trillo, você tem que falar em espanhol.
Trillo: Mas você também não falou agora!
Dus’Cuais: Não falei porque você não falou. Aí eu falei pra você poder falar, entendeu?
Trillo: No, no.
Dus’Cuais: Entonces diga buenas tardes.
Trillo: Buenos Aires!
Dus’cuais: No, no! Buenos Aires es una ciudad de Argentina. Chega, Trillo, vamos usar a tecnologia a nosso favor. Vamos usar o Google Tradutor. Bia, que língua você quer aprender?
Brenda: Hmm, chinês.
Trillo: Vamos ver como se fala “bom dia” em chinês.
Digitamos “bom dia” no Google Tradutor. A resposta: 早安. “Zǎo ān”. Ficamos ouvindo e tentando falar chinês, até que o Trillo cochichou com a Bia e disse para mim:
Trillo: 我不會說話 (Wǒ bù huì shuōhuà)
Dus’cuais: O quê? Não entendi nada.
Eles riram juntos. Pressionei. Nada. Saí do quarto enquanto Trillo e Bia riam da minha cara. Estou sem entender até agora.
Caracas!
Naquele mesmo dia encontramos uma mãe e um paciente venezuelanos. José, que está no Brasil desde o meio do ano, não fala português, mas entende. Eu disse que também não falo espanhol, mas entendo. E ali começamos a bater o maior papo, no melhor estilo portunhol.
Eu senti que José queria conversar e fiquei pensando na dificuldade de estar em outro país e não falar a língua.
Com os palhaços ele poderia falar – se a gente entendesse estava tudo bem, se não entendesse, estava tudo bem também, a gente dava um jeito de se entender de outras maneiras. Falamos das cidades em que nascemos e moramos. José (que se pronuncia Rossé) nos contou que mora perto de Caracas.
Expliquei pra ele que, aqui, “caracas” é uma expressão de espanto.
Conversamos mais sobre as diferenças e as semelhanças das línguas e, quando estávamos indo embora, eu tropecei na lixeira do quarto. O José mostrou que aprendeu tudo:
José: Caracas!
Rimos juntos. Tá provado ou não tá?