São 12 horas e 10 minutos em uma tarde quase chuvosa de poucos raios solares em Campo Grande, no Rio de Janeiro. E como é grande esse Campo… o Rio de Janeiro tem muitos campos de extensão. Mas cheguei… o Hospital Estadual Eduardo Rabello é longe, mas eu cheguei!
Logo na recepção tive um estranhamento: “que vazio”. Não é comum ver uma recepção de hospital público vazia.
Mas o recorte da população assistida nesse hospital talvez justifique uma demanda não tão grande, ou será que está vazio por que é distante, lá em Campo Grande? Não sei!
O Hospital atende a 3ª e melhor idade. Essa peculiaridade desenha os traços da atuação de hoje, o público de idos@s é muito amoroso.
Curiosamente, boa parte da equipe de saúde também é idosa. E mesmo não tendo contato com os pacientes (pois a locomoção dos mesmos é limitada para ir até o auditório assistir ao show), o carinho das senhoras da equipe literalmente facilitou o meu trabalho.
Fiquei quase com uma sensação impostora, quando percebi que na verdade eu que estava ali para ser alegrado e nutrir minha áurea com esse povo: é muito fácil trazer alegria pra essa gente!
Me diverti tanto, mas tanto, que nem vi a hora passar. Num estalar de dedos eu já estava retornando pra casa, flutuando pelos caminhos de Campo Grande, reverberando a magia deles dentro de mim.
Lá fui eu pelos corredores antes do show, em cima das pernas de pau, no chamamento do público:
MortaNdela – boa tarde , eu sou o MortaNdela! Mas pode me chamar de “Mô”, não “Mô” de “Amô”… “Mô” de MortaNdela.
Senhora na recepção – ahh, mas eu quero chamar de amor!
MortaNdela- então pode!
Meu destaque de encontro hoje vai para Elaine, uma mulher negra, de idade mediana aos 50/60 anos. Usava óculos para ampliar o campo de visão de seus belos olhos grandes e atentos.
Chegou com a sua companheira de trabalho antes do show começar, sentaram estrategicamente na 3ª fileira – nem muito perto, nem muito longe.
Mas MortaNdela é mais defumado que para raio em alto de arranha céu, captou a energia de Elaine que precisava participar do show.
Ela, que até então acompanhava boa parte do espetáculo filmando no celular, se viu obrigada a pausar a gravação para participar da mágica dos lenços.
O espetáculo “Circo do Seu’Leo” é comandado por MortaNdela, que se vê obrigado a substituir o Mágico que não apareceu. As mágicas acontecem sempre do avesso.
A saca mágica contém dois lenços: um branco e outro vermelho, do qual o palhaço anuncia:
MortaNdela – “elas irão colocar os lenços aqui e os lenços irão trocar de cor”. Elaine com lenço vermelho e dona Célia com lenço branco. Elas colocaram na sacola, eu disse as palavras mágicas e… “Tcharam”
MortaNdela (perguntando pra Célia que tinha o lenço branco) – qual era a cor do seu Lenço?
Celia – Branco
MortaNdela – (entrega o Lenço) – está vermelho
Os risos tomam conta do público. Quando olho para Elaine, a mulher estava rindo muito, já esperando o lenço branco, ela não se controlava de tanto rir, nem conseguia me responder.
MortaNdela – que isso Elaine… tá tudo bem (ao público) alguém chama o Cardiologista!
Comecei a me deixar contaminar pelo riso dela e fui me imbuindo daquela incontrolabilidade abdominal. Riamos juntos, Elaine já estava chorando de rir.
MortaNdela – o que foi, Elaine, do que vc tá rindo?
E lá do outro lado, como uma criança, Célia reivindicava:
Celia – não vale, vc trocou os nossos lenços!
MortaNdela – peraí, que eu preciso resolver um particular aqui!
Me viro para a Elaine e pergunto:
– qual era a cor do seu Lenço?
Elaine dá uma pausa, respira fundo e responde: – vermelho.
Mortandela – e ficou vermelho de bolinhas brancas!
Inverti a expectativa e ainda fiz a mágica de sumir um lenço e aparecer outro. Mas essa virtuose não importa, o que importa é o comentário de Elaine a sua colega ao final do número:
Elaine (extasiada) – aí ai, já valeu a pena, ainda bem que a gente veio!
Fui até o final brincando de brincar, no mais leve sonhar, em versos pintados com poemas do avesso, em rios de lágrimas salgadas de alegria. Que graça o divino me dá em “interlocutar” o riso nessa gente… que graça!
No final, ao ver o astral elevado de toda aquela gente, reafirma-se o quão importante é esse espaço de ludicidade para equipe de saúde. Esses profissionais, que cuidam dos nossos, também precisam de cuidado.
E poder levar o riso até eles, reverbera num ambiente de trabalho mais leve que facilita e potencializa o bem estar do paciente.
Obs: depois de tudo encerrado, fomos tomar café no refeitório e fui abordado por uma colaboradora. Ela estava agoniada a perguntar como eu faço a mágica de engolir o balão, pois ela tem problema de estômago e ficou com “nó na garganta” de assistir:
Léo – pode ficar tranquila, eu tomei estomazil!
Milvia – para com isso, menino, eu não vou nem dormir de noite.
Léo – tá bom… eu NÃO engoli o balão!
Milvia – mas como é que você transformou em papel e tirou aquela fita colorida da boca?
Leo – isso eu não posso contar, porque é segredo de Mágico!
Detalhe: contei isso pra nossa equipe, o motorista da equipe de Doutores da Alegria – que assistiu o espetáculo, me revelou que Milvia comentou “vou sentar lá atrás pra não ser chamada pra participar”ao entrar no salão.
E justamente ela foi chamada a participar na mágica do adivinho. Eita, ENERGIA!
Léo Gaviole – Palhaço MortaNdela