Conhecemos o menino no corredor do Hospital do Mandaqui. Eufórico, veio correndo pedindo para eu tocar uma música no cavaquinho.
A cantoria começou. Virou dança, rebolado e então demos o diagnóstico: o pequeno estava com a cintura solta. O bom é que cintura solta deixa a gente alegre, comunicativo e feliz. Seguimos caminhando e ele foi junto, requebrando e cantando. Foi quando seu pai apareceu para dar a boa notícia:
– Vem, filho, você acabou de receber alta médica e nós vamos embora!
Mas aquela não era a melhor notícia para o menino. Ele queria mesmo era continuar dançando. Fez cara de tristeza e pediu pro pai esperar um pouquinho mais. O pai concordou e disse que enquanto arrumava as malas, ele poderia estar conosco, e assim seguimos pelo hospital, Dr. Cavaco, Dr. Chabilson e o pequeno dançarino, de quarto em quarto.
A euforia era tanta que ele começou a mexer em nossos bolsos, pegar objetos e a mandar na gente. Até parecia um pequeno chefe! E as ordens eram tantas que começaram a dificultar o atendimento às outras crianças. Como ele queria ajudar, fui fazendo pedidos:
– Pode, por favor, ficar de segurança na porta desse quarto?
– Pode segurar essa parede?
Mas ele não se aguentava e logo voltava pra ficar bem pertinho de nós e seguir na brincadeira. Até que pegou meu cavaquinho. Expliquei que era meu instrumento de besteirologista e que havia ainda outras crianças a serem atendidas. Resolvi pedir para a criança ir até o quarto ajudar o pai a fazer as malas. Ele não gostou muito da ideia, mas foi.
Conseguimos seguir com os atendimentos quando, de repente, no meio de um samba, começamos a ouvir um som de um instrumento diferente… Olhamos para a porta do quarto e era o pequeno de nariz de palhaço, com um vidro de xarope na mão e uma seringa na outra, tocando como se fosse um tamborim.
Caímos na gargalhada. O menino conseguiu a vaga de besteirologista por um dia!
Um pouco depois, seu pai veio chamar para ir embora. Chorando, ele se despediu de nós e do hospital. Muitas vezes não é o local em que estamos que influencia em nossa alegria, mas como estamos. O pequeno recebeu a notícia que na maioria as vezes é a mais esperada dentro de um hospital: ter alta.
Mas para ele, aquilo não era o mais importante no momento. Queria continuar ali, brincando e tocando. Queria se divertir. Não queria ir embora. Será possível estarmos alegres independentemente do local em que estamos?